quarta-feira, 15 de junho de 2011

A Revolução Científica em Portugal

Antes da Revolução Científica, os Descobrimentos Portugueses impulsionaram o desenvolvimento tecnológico e levaram ao reconhecimento da experiência na descrição do mundo que nos rodeia. Foi o astrónomo, matemático e historiador espanhol Abraão Zacuto, nomeado Astrónomo Real, que encorajou a ideia do rei D. Manuel I de realizar uma viagem marítima à Índia. Aperfeiçoou o astrolábio, sendo-lhe inclusivé atribuída a construção do primeiro astrolábio metálico, e publicou um livro com tabelas astronómicas que, depois de traduzido, foi um dos primeiros livros impressos em Portugal, em 1496. Tanto Vasco da Gama como Pedro Álvares Cabral fizeram uso destas tábuas astronómicas e do astrolábio metálico para estimar a latitude a que se encontravam nas suas viagens. Os navegadores portugueses estudaram também a relação entre a leitura da bússola magnética e a longitude, calculando o ângulo entre a agulha magnética e o meridiano geográfico. É de João de Lisboa o texto mais antigo, de 1514, sobre a determinação da declinação magnética.

Foi também nesta época que surgiu o maior cientista português de todos os tempos: Pedro Nunes (1502-1578). Este astrónomo e matemático, que tinha estudado em Salamanca, foi nomeado cosmógrafo real e leccionou na Universidade em Lisboa e em Coimbra, quando a anterior foi para lá transferida. Produziu um grande número de obras desde 1537, das quais só as que foram impressas chegaram aos nossos dias, contribuindo para melhorias na navegação. O nónio, processo de medição que inventou, permitiu efectuar medidas com maior precisão: consistia em aplicar a um instrumento duas escalas graduadas que podiam deslizar uma sobre a outra. O seu trabalho foi difundido além-fronteiras e grandes sábios como Tycho Brahe e Pierre Gassendi reconheceram a sua importância. O Papa Gregório XIII pediu a Pedro Nunes, já perto do final da sua vida, um parecer acerca do novo calendário com que pretendia substituir o calendário juliano. Quanto ao modelo heliocêntrico de Copérnico, apesar de o achar correcto numa perspectiva matemática, Nunes não o defendeu nem o contrariou.

Numa época em que a Inquisição controlava com bastante sucesso qualquer tentativa de desponte da Revolução Científica em Portugal, foram os jesuítas, chegados a partir de 1540, com a  fundação de colégios, tendo sido os primeiros o Colégio de Jesus em Coimbra e o de Santo-Antão-o-Velho em Lisboa, que formaram os membros desta ordem em matemática e astronomia, para que depois ensinassem no Oriente ou na Europa. Merece especial destaque Christophorus Clavius (1538-1612), de origem alemã, que estudadou no Colégio das Artes, em Coimbra. Crê-se que tenha sido aqui que, ao observar um eclipse do Sol, decidiu dedicar-se à astronomia. Foi o coordenador da comissão papal de matemáticos que reformulou o calendário para o gregoriano, que entrou em vigor em Portugal no ano de 1582. Refere várias vezes nas suas obras Pedro Nunes, por quem nutria grande admiração, transmitindo-a também aos seus discípulos jesuítas. Galileu, ainda jovem, procurou-o numa das suas visitas a Roma para com ele discutir alguns problemas da mecânica dos sólidos e, ao ser bem recebido por Clavius, passou a trocar correspondência com ele. Clavius incentivou Galileu à medida que este lhe enviava cópias dos seus trabalhos. Clavius pôde confirmar as observações de Galileu sobre os satélites de Júpiter e, provavelmente, as primeiras referências em Portugal das descobertas galilaicas terão sido efectuadas a partir de uma obra sua em que afirma que os astrónomos deveriam incluir as considerações de Galileu na construção da esfera celeste se estas se revelassem verdadeiras. No entanto, o matemático jesuíta era adverso ao modelo heliocêntrico.

De entre as tentativas de implementar o ensino de ideias não-aristotélicas e anunciar as descobertas de Galileu, evidenciam-se as dos jesuítas Christophoro Borri e de Christophorus Greinberger. Mas, após a morte de Clavius, a Santa Sé retirou ao primeiro a cátedra intimando o segundo a que renunciasse às ideias da Revolução Científica. No entanto, Borri conseguiu reformular parte do ensino de Filosofia com o seu livro de 1631 e os seus sucessores continuaram o seu ensino num formato diferente do aristotélico. Em Évora, Soares Lusitano, nomeado reitor em 1658, referiu os grandes nomes da Revolução Científica contribuindo para a actualização científica de Portugal.

Integrado no movimento da Contra-Reforma, o texto de escolástica tardia Os Conimbricenses, do qual Pedro da Fonseca foi um dos autores, foi publicado em 1696, reafirmando as ideias de Aristóteles. No mesmo ano, a Companhia de Jesus suspendeu António Cordeiro, que ensinou nos colégios jesuítas de Lisboa e, durante 20 anos, de Coimbra referindo autores como Galileu, Kepler, Descartes (que, em novo, tinha estudado pel’Os Conimbricenses, que lhe desagradaram profundamente) e Gassendi nas aulas de Filosofia. Os seus apontamentos só foram autorizados em 1714.

Natacha Violante Gomes Leite

Bibliografia:

- Fiolhais, Carlos e Martins, Décio, (2010). Breve História da Ciência em Portugal. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra e Gradiva.
- http://scientia.artenumerica.org/noniana/noniana.html
- http://scientia.artenumerica.org/noniana/obras.html
- http://pt.wikipedia.org/wiki/Nónio
- http://pt.wikipedia.org/wiki/Cristóvão_Clávio
- http://www.newadvent.org/cathen/04252a.htm

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