“Now, after the first shock is over, I begin to collect myself. Yes, it was very dramatic.”
Wolfgang Pauli
A ideia de paridade de um sistema surge da analise das suas propriedades de simetria. Se, ao mudar as coordenadas de um sistema de r por –r, se obtiver um outro sistema que obedece às mesmas leis físicas do primeiro, diremos que é invariante em relação à paridade espacial ou paridade P (existem outros dois tipos de paridade, como a temporal T e a de carga C). Neste caso, o sistema original e o segundo são fisicamente indistinguíveis: ambos representam estados físicos possíveis e experiências efectuadas nos dois sistemas dão os mesmos resultados. Por exemplo, é fácil verificar que as interacções gravitacional e electromagnética são invariantes por paridade. O conceito de paridade e da sua conservação surgiu com o desenvolvimento da mecânica quântica. Nessa teoria a paridade de um sistema é definida como o produto das paridades (1 ou -1) de todas as suas componentes: se o valor for o mesmo antes e depois de uma interacção, a paridade diz-se conservada.
No século XX, com a investigação do núcleo atómico e das partículas subatómicas, outras duas interacções fundamentais foram descobertas: a interacção fraca e a forte. O que parecia natural era que também estas fossem invariantes e que a conservação da paridade fosse uma propriedade de todas as interacções fundamentais, o que se demonstrou estar errado, com a descoberta da violação de paridade nos decaimentos β, devidos a força fraca.
Em 1956, dois físicos chineses, T. D. Lee e C. N. Yang, observaram que não havia nenhuma experiência que provasse a conservação de paridade na força fraca. Estavam a trabalhar no que era conhecido como o puzzle θ-τ: era, de facto, conhecida a existência de duas partículas, chamadas θ e τ, que tinham igual spin, massa e tempo de vida médio (dentro das incertezas experimentais) e, portanto, suspeitava-se que fossem a mesma partícula. O facto é que elas, ao decaírem através de um processo semelhante ao decaimento β, davam origem a produtos diferentes: dois piões num caso, três no outro. Em 1953, o físico australiano R. H. Dalitz argumentou que, sendo a paridade de um pião -1, pela conservação da paridade a partícula θ devia ter paridade +1 e a partícula τ paridade -1, e, portanto, não podiam ser a mesma partícula. Ao avançarem com a ideia de violação de paridade, Lee e Yang propuseram também algumas experiências que pudessem testar a sua teoria: uma delas era observar a emissão de partículas β de uma fonte cujos spin estivessem todos alinhados por um campo magnético externo. Invertendo esse campo os spins alinham-se no sentido oposto, obtendo-se portanto uma reflexão das coordenadas. Se houvesse conservação de paridade, a emissão de electrões, que se dá ao longo dos pólos dos núcleos, seria observada nas duas direcções, no sentido do campo e no sentido oposto, com a mesma intensidade, de modo que seria impossível distinguir entre os dois sistemas. Pelo contrário, se houvesse uma direcção preferencial, revelar-se-ia a violação de paridade.
Aparentemente a proposta de Lee e Yang não suscitou muito interesse: a ideia da possibilidade da violação da paridade era contrária ao senso comum, não sendo por isso fácil de aceitar. Quem se interessou primeiro pelo assunto foi uma física chinesa, C. S. Wu, na altura professora na Universidade de Columbia, em Nova Iorque: ela tinha discutido a experiência com Lee e Yang, tendo começado a trabalhar nela mesmo antes do artigo deles ter sido publicado.
A experiência em si mesmo apresentava bastantes dificuldades técnicas: em primeiro lugar, para conseguir um alinhamento suficiente era preciso atingir temperaturas da ordem de 0,01 K, temperaturas essas que era preciso manter ao longo de um certo tempo por efectuar as medidas. Tais temperaturas só podiam ser atingidas através da desmagnetização adiabática: a amostra de cobalto foi misturada com um material paramagnético e o sistema submetido a acção de um campo magnético que o magnetizou, até se conseguir a polarização quase total da amostra. Retirando suavemente o campo magnético os átomos distribuíra-se entre os vários estados possíveis e, ao fazer isto, gastaram energia, retirada da agitação térmica. Consequentemente, a temperatura do sistema baixou.
Outro problema era que a amostra de cobalto tinha que estar em vazio, assim como os detectores. Depois de muitas tentativas a experiência deu finalmente resultados positivos: no início da medição era possivel ver uma clara assimetria que ia desaparecendo à medida que o sistema aquecia. Os dados obtidos são representados na figura de cima e representam a emissão de electrões em relação a direcção do campo magnético aplicado: no lado esquerdo da figura observa-se uma assimetria nas duas situações que não devia existir se não houvesse violação de paridade (as curvas deviam estar sobrepostas). Com o aquecimento da amostra e o consequente desalinhamento dos núcleos os electrões são emitidos em todas as direcções e a asimentria desaparece. Este resultado foi confirmado independentemente por experiências feitas logo a seguir sobre o decaimento de mesões μ e π.
Na altura, a descoberta da violação da paridade constituiu um grande choque no mundo da física. Mas só com a descoberta de propriedades inesperadas da Natureza se consegue compreendê-la mais a fundo.
Figura: Resultados da experiência de Wu.
Caterina Umiltà
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